– E ele anda sempre
assim, em todos os lugares?
– Sempre.
– Mas como é que pode?
– indagou ele descruzando as pernas e virando para encará-la. Incrível o efeito que o
“ele” em questão fazia em seus olhos.
– Você não sabe de
nada, não é? – não, ele não sabia de nada perto dela.
– Sei sim.
– Ele é muito maior do
que você está vendo. Só fica assim pequenininho porque está muito longe.
Na mesma hora ele junta
o polegar e o indicador, fechando apenas um dos olhos. Ele cabia direitinho
entre os dois. Como podia ser assim tão grande como ela dizia?
– Ele não cabe entre
seus dedos, bobo. Já te disse. Se você fizesse isso de verdade, ia se queimar
feio.
– Ele também queima? –
o menino se assustava cada vez mais com as revelações dela. Como era
inteligente. Como sabia de tudo! Ele seria capaz de fazer perguntas o resto do
dia só pra escutar suas explicações.
– Claro que queima! Vai
dizer que você não sabia que ele é feito de fogo? Só fogo, em milhares de
explosões, a galáxias de distância. Ele não passa de uma bola de fogo. Ou melhor,
de uma estrela gigante.
– Estrela?! De dia?! –
agora ele a tinha pegado – impossível! Você não sabe que as estrelas só
aparecem à noite? Dã!
Ela o fitou impaciente
e divertida ao mesmo tempo. Por que eles demoravam tanto para crescer?
– As estrelas estão no
céu o tempo todo. De dia e à noite. A diferença do dia para a noite é que, como
ele é muito maior que as outras, durante o dia, sua luz ofusca a das outras
estrelas. Aí não dá pra ver as menores. O Sol é muito mais forte. Você já
tentou acender uma lanterna com a luz acesa?
– Já.
– Fazia diferença?
– Não.
– E à noite? – ela se
deliciava com sua superioridade intelectual.
– À noite minha
lanterna é capaz de espantar qualquer monstro no quarto. – disse orgulhoso o
menino, que guardava embaixo da cama sua arma mais poderosa contra barulhos no
armário.
Monstros no quarto? Eles
realmente não crescem nunca.
– É a mesma coisa com
as estrelas. De dia, com uma luz tão forte, elas não aparecem. Mas basta ele se
esconder, elas se acendem brilhantes, iluminando o céu.
– Que egoísta, ele. Quer
aparecer mais que os outros.
– Nada disso. É por
isso que ele se esconde sempre. Se não escurecesse, as estrelas não teriam a
chance de brilharem também e nós nunca saberíamos que elas existem.
Silêncio. O menino
pensava no que escutou ainda olhando para o alto. De esguelha, se aproxima dela
no gramado onde os dois estavam deitados à sombra do pé de seriguela. Ela nem,
nem…
– Entendi. Mas ainda
não faz sentido.
Ela revira os olhos
incrédula.
– O quê?!
– Mesmo de dia, seus
olhos brilham como as estrelas à noite. Você é imune ao sol? – pergunta
sinceramente o menino.
Ela, muda, não tinha
resposta e volta a olhar o céu.
Clarice Freire
Fonte: Pin it, Pó de lua.
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