Se
você pensa que sabe; que o ano novo mostre o quanto não sabe. Se são sempre os
outros que são isso e aquilo; que o ano novo ensine a olhar mais para você
mesmo. Que o ano novo ensine que não existe ano novo para a natureza. É tudo um
fluxo só.
O mundo não sabe que o ano mudou. A gente é que o supõe para
abastecer o farnel das esperanças combalidas. Para a natureza, o novo é cada
estação, primavera, verão, outono, inverno. Aí tudo muda. O único ente da
natureza que comemora o ano novo é o homem. A vida é substantiva, nós é que
somos adjetivos. Já viu flor comemorando o ano novo? Então modere a sua
comemoração. De qualquer maneira, feliz ano novo.
Se
você pensa que viver é horizontal, unitário, definido, monobloco; que o ano
novo ensine a aceitar o conflito como condição lúcida da existência. Tanto mais
lúcida quanto mais complexa. Tanto mais complexa quanto mais consciente. Tanto
mais consciente quanto mais difícil. Tanto mais difícil quanto mais grandiosa.
Felicidade é disponibilidade com paz; que o ano novo ensine a aproveitar os raros
momentos em que ela surge.
Que
o ano novo nos ensine, a todos, a dizer as verdades nunca na hora da raiva. Que
desta aproveitemos a forma direta e simples pela qual as verdades se nos
revelam por seu intermédio; mas para dizê-las depois, quando os bloqueios
voltam e é mais cômodo “deixar pra lá”. Que a lucidez da raiva guardada para
depois, quando ganhar a dimensão da calma mas perder a energia agressiva, sirva
para expressar nossas franquezas com carinho e cordialidade.
E
se ano novo não existe, exceto na imaginação da gente e se nesta tudo é
possível, então que ele sirva para transformar tudo em Verbo. Como no
princípio. Pois do jeito que o mundo vai, dá vontade de apagar e começar tudo
de novo.
Arthur da Távola
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